quarta-feira, junho 18, 2008

Margem do sensível



Morre-se no Afeganistão. Mas ninguém liga. Morre-se, já está.
Morre-se no Iraque. Já não impressiona! Foram-se mais umas vidas…
Morre-se no Darfur. Que importa? Mais uns tantos, menos uns quantos…
Morre-se na estrada. Bum! Igual ao costume, tinham a hora marcada.
Morre-se à entrada e à saída da discoteca. Um marginal, já se esperava!
Que mundo é este que já não se impressiona com a morte?
O locutor televisivo apresenta a notícia mecanicamente,
o ouvinte já nem faz balanço aos números, julga-se com sorte,
os políticos remendam discursos, prometendo prevenções incumpridas,
os académicos refugiam-se em explicações metafísicas desabridas,
os cidadãos confessam-se atingidos só quando a fatalidade bate à porta.
Perdeu-se a sensibilidade? A vida é para desprezar?
Há um filho que fica sem pais,
um velhinho que perde os únicos entes protectores,
o marido que perde a mulher e a mulher que perde o marido,
crianças que ficam sem o apoio dos progenitores!
Estes dramas não chamam a atenção de qualquer um?
A sociedade não pode perder ou esquivar-se à sensibilidade,
todos temos uma quota parte de responsabilidade
pelo que sucede no planeta de lés-a-lés…
Respeitemos a dor, a tristeza, a solidão dos enlutados,
que perderam o afecto deste ou daquele ente querido,
restando-lhes a existência ao invés!
Repensemos a guerra, que a nada conduz,
estejamos com os que sobrevivem à tragédia!
Evitemos o amorfismo dos que se sentem acomodados,
pois somos todos seres enobrecidos,
quando pegamos aos ombros aquela cruz,
tantas vezes de braços retorcidos,
mas que grita e ecoa que a vida não é comédia
e que há uma margem do sensível para tantos rumos cortados!